quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Meu marido


Meu marido é um homem simples, desses que chegam em casa com cheiro forte de bebida na boca e um olhar triste devido não poder dar aos filhos, que são seis, e talvez a mim também uma vida mais agradável e sem tantas necessidades.
Pontual e metódico abre o portão de ferro, sempre com o mesmo rangido há nove anos, deixando-o bater atrás de si. Com a mão esquerda empurra a porta da cozinha, que também é nosso quarto, e deixa sobre a cama um pacote, que é sua marmita vazia, e sem me olhar vem em minha direção, beija-me um beijo sem sentido no lado direito do rosto, pois minha boca calada já não possui mais identidade, e lança-se ao banheiro deixando a porta semi-aberta de onde se ouve os gritos da garganta arranhada gurgitando as esperança bebidas num copo sujo de bar. O mais velho dos meninos corre a lhe levar as chinelas e a toalha, os demais esperam que o pai tome logo seu banho para então sentarmos à mesa e jantarmos juntos como todos os dias o fazemos. Na verdade, não há mesa, pois sentamos nas beiras das camas que são três e antes rezamos uma reza que meu marido inventara, mas que nos faz contente e nos deixa calmos. Comemos arroz, pão e em seguida um mingau de fubá.
Reparo em meu marido traços que desmentem sua idade... Meu marido é novo, meu marido é velho...
Os três meninos na hora de irem pra cama, o cercam e revisam a tabuada, e ele parece sorrir... Sei que é um sorriso cansado... As três meninas também o cercam, estas com beijos e afagos...
Nunca vejo quando ele se levanta pra ir trabalhar, mas sei quando está saindo, pois ouço sempre o velho rangido e o barulho do portão de ferro batendo atrás de si.



02/11/2007

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